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terça-feira, 3 de março de 2020

POLÍTICA  DESTAQUE
Redação F8   2 de Março de 2010

E A CULPA É (SÓ PODE SER) ...

A acção do Estado angolano contra Isabel dos Santos, no âmbito do processo cível no qual o Estado reclama um crédito superior a mil milhões de dólares, deu entrada hoje no Tribunal Provincial de Luanda, segundo fonte judicial. " O julgamento tem todos os contornos de um julgamento de fachada", disse  Robert Besseling, director da consultora EXX África.

A acção dá seguimento ao arresto preventivo de contas bancárias e participações sociais da empresária Isabel dos Santos, do seu marido Sindika Dakolo  e do gestor Mário Leite  da Silva, decretado pelo Tribunal Provincial de Luanda, em Dezembro, indicou uma fonte da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Em 31 de Dezembro de 2019, o Tribunal Provincial de Luanda decretou o arresto preventivo, das contas bancárias pessoais de Isabel dos Santos, de Sindika Dokolo e de Máreio Leite da Silva, no Banco de Fomento Angola (BFA), Banco Internacional de Crédito (BIC), Banco Angolano de Investimentos (BAI) e Banco Económico, além das participações sociais que os três detém enquanto beneficiários efectivos no BIC, Unitel, BFA e ZAP Média.

O despacho-sentença proferido na altura dava como provada (sem necessidade de contraditório) a existência de um crédito dos requeridos para com o Estado angolano num valor superior a mil milhões de dólares (894,9 milhões de euros), dívida que os requeridos terão reconhecido, mas alegaram não ter condições para pagar, de acordo com o documento.

"O arresto era uma medida cautelar, visava garantir que existiam bens para pagar a dívida. Nesta fase do processo as partes terão oportunidade de apresentar provas que façam valer as suas pretensões ou contestar as acusações de que são alvo", explicou a mesma fonte.

Em função do desenvolvimento da acção "as partes poderão chegar a um acordo" quanto à resolução do diferendo, adiantou a fonte da PGR.

Isabel dos Santos, filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos e Presidente Emérito do MPLA, foi constituída arguida no âmbito de um outro processo por alegada "má gestão e desvio de fundos" enquanto presidente durante 18 meses da companhia petrolífera estatal Sonangol.

A empresária rejeita as acusações e queixa-se de perseguição e de ser "alvo de uma campanha [...] orquestrada por vários órgãos de comunicação social".

Aliás, como o Folha 8 ontem escreveu, a consultora EXX África considerou que os irmãos José Filomeno e Isabel dos Santos são os "bodes expiatórios" de uma campanha governamental para convencer os investidores internacionais a apostar em Angola, apesar de a corrupção se manter generalizada.

"O julgamento tem todos os contornos de um "julgamento de fachada" que é politicamente motivado para satisfazer as exigências dos investidores relativamente a passos concretos contra a corrupção, e o único objectivo aparente foi acusar e prender o filho do antigo Presidente como bode expiatório da corrupção do passado", escreveu o director da consultora, Robert Besseling.

O relatório, com o título "Líderes do Estado-sombra de Angola põem em perigo a agenda de privatização", argumenta que "o Governo de João Lourenço está a tentar fazer dos apoiantes do antigo Presidente os bodes expiatórios pelo fraco desempenho da economia, dizendo que há actos de sabotagem económica que estão no centro das frequentes faltas de combustível".

No documento, o analista escreve que esta tese "está a começar a dividir o MPLA, no poder há 44 anos, que é tradicionalmente unidos e que tem garantido a estabilidade política no país desde o final da guerra civil".

"Há fontes bem informadas que asmitem que pode haver uma cisão permanente no partido se não houvesse melhorias na economia e se os percepcionados "julgamentos de fachada" a membros da família do antigo Presidente não pararem", acrescenta.

O julgamento, lê-se ainda no relatório, "não deverá inspirar muita confiança na campanha do Presidente João Lourenço, contra a corrupção e é mais provável que seja desvalorizada por muitos angolanos como um "julgamento de fachada" com o propósito que seja desvalorizada por muitos angolanos como um 'julgamento de fachada' com o propósito de atingir e encontrar um bode expiatório do antigo Governo pelos problemas socioeconómicos actuais".

Para a EXX África, a ordem judicial que arresta os bens de Isabel dos Santos em Angola "é vaga sobre quais os activos que ficam imobilizados e há especulação sobre a data da divulgação, que parece ter sido especificamente escolhida para ler uma atenção maior dos meios de comunicação social".

Para além disso, aponta o analista, "há fontes locais que dizem que Isabel dos Santos está a ser alvo do Governo para entregar certos activos na banca e nas telecomunicações nas vésperas das privatizações, para agradar aos investidores estrangeiros, mas sem seguir as diligências processuais".

O Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação reproduziu em 19 de Janeiro mais de 715 mil ficheiros, sob o nome de Luanda Leaks, que detalham alegados esquemas financeiras de Isabel dos Santos e do marido que lhes terão permitido retirar dinheiro do erário público angolano através de paraísos fiscais.

Angola continua a esperar obter a cooperação de outros países que estejam abrangidos pelo caso Luanda Leaks, que envolve Manuel Vicente, perdão, Isabel dos Santos, conforme rogou no dia 21 de Janeiro, em Londres, o ministro de Estado para a Coordenação Económica, Manuel Nunes Júnior.

Numa intervenção no Instituto Real de Relações Internacionais ChathamHouse, o governante do MPLA, ex-ilustre ajudante de José Eduardo dos Santos, disse que espera "cooperação em termos diplomáticos com todos aqueles países que sintam que aspectos que foram trazidos à luz tenham relevância para os seus países".

"O combate que estamos a fazer ao mau uso de recursos públicos em Angola é um combate sério, firme e vai continuar, porque precisamos de ter em Angola uma sociedade que respeite a lei. Vamos buscar a cooperação de todos aqueles países que podem ser relevantes nesta luta contra a corrupção", afirmou Manuel Nunes Júnior, questionado sobre o caso Luanda Leaks.

O Governo do impoluto e honorável, para além de amigo, Teodoro Obiang Nquema Mbasogo já prometeu colocar à disposição do MPLA todo o seu prestigiado sistema de justiça. Assim, como um emblemático Estado de Direito, a Guiné Equatorial apenas agurada a chegada da setença que mais interessar ao MPLA de João Lourenço para, a aprtir daí, fazer o julgamento... 

O ministro angolano admitiu que o caso relativo à filha do seu anterior Presidente e "escolhido de Deus", Josér Eduardo dos Santos, "é uma situação sensível, mas é algo que o executivo angolano tem realmente de tratar".

Sobre o papel das consultoras que faziam auditorias a empresas, referiu que "vários órgãos de Angola e não só vão ter de pegar nessa informação toda, analisá-la e ver os passos seguintes". Boa! Como se o Governo não soubesse melhor do que ninguém o papel consultores. Como se não tivesse sido o impoluto Governo do MPLA a fornecer o dossier do Luanda Leaks. 

O Consórcio Internacional de Jornalismo de (suposta) Investigação (ICIJ) revelou 715 mil ficheiros, sob o nome de Luanda Leaks. Suposta investigação porque os jornalistas se limitaram a receber o dossier (através de uma fuga estratégia e conveniente) e a ler algumas partes, limitando-se a reproduzir as partes que consideraram mais interessantes. Investigar significa indagação ou pesquisa que se faz buscando, examinando e interrogatório.

De acordo com a leitura deste conjunto de órgãos de comunicação social, entre os quais o Expresso e a Sic, Isabel dos Santos terá montado um esquema de ocultação que lhe permitiu desviar mais de 100 milhões de dólares (90 milhões de euros) para uma empresa sediada no Dubai e que tinha como única accionistas declarada a portuguesa Paula Oliveira, amiga de Isabel dos Santos e administradoras da opoeradora NOS.

Os dados divulgados envolvem também o advogado pessoal da empresária, o português Jorge Brito Pereira (sócio da Uría Menéndez, o escritório de Proença de Carvalho), o presidente do Conselho de Asministração da Efacec, Mário Leite Silva (CEO da Fidequity, empresa com sede em Lisboa detida por Isabel dos Santos e o seu marido) e Sarju Raikubdalia (ex-administrador financeiro da Sonangol).

Segundo os documentos (cuja autenticidade os jornalistas não verificaram), Isabel dos Santos e Sindika Dokolo têm participações accionistas de empresas e bens, como imobiliários, em países como Angola, Portugal, Reino Unido, Dubai e Mónaco.

O actual ministro de Estado para a Coordenação Económica, que esteve em Londres a representar o Presidente João Lourenço, na primeira Cimeira de Investimento Reino-Unido-África, falava após uma palestra intitulada "Angola e compromisso com a Economia: Avaliação do Progresso das Privatizações e Outras Reformas Económicas".

Manuel Nunes Júnior salientou a implementação teórica de "um verdadeiro Estado de direito" (à medida do MPLA) como essencial para atrair investidores estrangeiros para o país e a necessidade de introduzir "medidas para combater práticas que não são saudáveis nem recomendáveis para o crescimento do país".

"Comecamos a viver um ambiente diferente em Angola. A nossa percepção sobre a corrupção e a impunidade e a percepção do resto do mundo sobre nós começa a mudar no sentido positivo", congratulou-se o ex-ministro de José Eduardo dos Santos.

O governante elogiou ainda a Procuradoria-Geral da República do Mpla por estar "a levar a cabo um combate efectivo contra a criminalidade económica e financeira" e os tribunais, que, garante, "têm exercício um nobre papel com plena autonomia".

Na verdade, o organismo dirigido pelo general Hélder Fernando Pitta Grós supostamente combate a criminalidade financeira de uma forma que está no ADN do MPLA. Primeiro é lavrada a sentença e depois é feito o julgamento. Ou seja, até prova em contrário todos os que têm a benção de João Lourenço são ... culpados.

Folha 8 com Lusa

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