Perfil
Mulher do Norte
Elisa Ferreira, eurodeputada, tem 58 anos e é uma mulher do Norte.
Nasceu no Porto, licenciou-se em Economia na Faculdade de Economia
da Universidade do Porto, fez o mestrado e o doutoramento na Universidade de
Reading, no Reino Unido. Em 1995, foi ministra do Ambiente no primeiro governo
de António Guterres e depois do Planeamento.
É deputada do Parlamento Europeu pelo PS desde 2004 e este ano
volta a integrar as listas socialistas.
Candidatou-se à Câmara do Porto como independente, mas perdeu para
Rui Rio. É e tem sido uma das vozes mais activas no Parlamento Europeu, integra
a Comissão de Assuntos Económicos e Monetários e foi relatora do documento do
Parlamento Europeu sobre o mecanismo de resolução bancária.
Rosário
Lira Bruno ProençaEconomia Para a eurodeputada, um dos problemas da UE é preocupar-se demasiado com critérios para défice e dívida e esquecer o crescimento económico. Erros repetidos no Tratado Orçamental.
Elisa Ferreira destacou-se enquanto eurodeputado, nomeadamente como relatora do documento do Parlamento Europeu sobre o mecanismo de resolução bancária, um dos pilares da união bancária.
O seu trabalho valeu-lhe elogios internacionais e até de
Pedro Passos Coelho.
Elisa Ferreira defende um maior aprofundamento da união
bancária para proteger os contribuintes dos eventuais problemas futuros nos
bancos.
Ainda assim, é muito critica do trabalho da troika e da visão que a
maioria de direita impôs: o equilíbrio orçamental trará automaticamente
crescimento económico.
Sobre a saída da troika de Portugal, acredita que Europa
quer uma saída limpa e não tem dúvidas que o PS ganhará as próximas eleições
europeias.
O primeiro-ministro destacou o seu papel no acordo alcançado entre o Parlamento
Europeu e o Conselho a propósito da união bancária. Estas palavras de Pedro
Passos Coelho caíram-lhe bem?
Caíram bem.
Foi simpático da parte dele ter tido essa iniciativa. O nosso trabalho neste
caso foi para Portugal e para a Europa, portanto ultrapassa as diveigências
partidárias. Estávamos a falar de uma matéria onde o Conselho tinha chegado a
uma posição de unanimidade, uma unanimidade forçada porque Portugal e vários
outros Estados estavam de algum modo subjugados pelo poder táctico da Alemanha
e de uma série de países amigos da Alemanha. A legislação estava muito desequilibrada
e era até perigosa. O Parlamento quando entrou nas negociações reequilibrou as
posições que vinham do Conselho.
Martin Schulz também fez elogios.
Houve
de facto um certo alívio com o reequilíbrio que já parecia impossível e que foi
conseguido com o papel do Parlamento.
Quanto ao acordo alcançado, é mais um passo na união
bancária. Os cidadãos podem ficar mais tranquilos perante eventuais problemas
noutros bancos?
Há um conjunto
de legislação, de que esta faz parte, que procura tirar as lições daquilo que
correu mal na crise da dívida soberana, que não começou na dívida soberana, mas
sim nos mercados financeiros. A lógica liberal que imperou durante muito tempo
levou a que houvesse uma ausência clara de regulação sobre os mercados
financeiros a nível mundial. A Europa podia ter tido um papel mais forte e não
teve. A partir de 2010, a atitude dos políticos mudou em relação a este
processo e no caso da regulação dos bancos, a gestão de uma crise bancária é
uma das peças desse quadro mais alargado. Pretende-se
criar um sistema em que haja regras claras de
funcionamento quando um banco entra numa situação de crise. Essa situação deve
dar origem a uma situação de resolução, que passa por intervir no banco e
reestrutura-lo profundamente de maneira a imputar as perdas aos accionistas e
a outros credores do banco e não aos contribuintes. Depois, há um fundo
financiado pela própria banca em função do seu risco, uma espécie de seguro,
que esta entidade que se encarrega da resolução do banco vai utilizar para
poder desmantelá-lo.
Com a nova legislação vai conseguir separar o risco
bancário do risco país? O que é importante para facilitar o financiamento à
economia?
É isso que
se pretende. Por isso, é muito importante a criação do fundo financiado pelos
bancos, que durante oito anos vai acumular o montante de 55 mil milhões de
euros para que as entidades de resolução tenham uma espécie de um fundo de
maneio para operarem. Agora, é muito importante que haja uma linha de crédito
enquanto este fundo é montado, caso haja uma situação de um banco que precise
de ser intervencionado.
Nós temos um mercado interno, livre circulação de
mercadorias e uma moeda única, mas ancorada no Tratado de Maastricht, acordada num pacto de estabilidade e crescimento com
limites de 60% para a dívida e 3% para o défice.
Esqueceu-se a parte do
crescimento, que é interpretada de uma forma grosseira e isto não chega.
O Parlamento Europeu discutiu recentemente um relatório
que avaliou o trabalho da troika nos vários países. Na sua opinião, como é que
se pode avaliar a troika?
Tenho sido
muito crítica do tipo de solução que foi encontrada. É uma solução admissível
numa situação de emergência, mas que esconde a reflexão que tem de ser feita. É
uma das mensagens desse inquérito sobre a troika: como é que uma união
monetária pode funcionar e vingar com economias tão diferentes. Nós temos um
mercado interno, livre circulação de mercadorias e uma moeda única, mas
ancorada no Tratado de Maastricht, acordada num pacto de estabilidade e crescimento
com limites de 60% para a dívida e 3% para o défice. Esqueceu-se
a parte do crescimento, que é interpretada de
uma forma grosseira e isto não chega. Crises num país ou na zona euro existirão
sempre...
Vamos continuar a ter troikas?
Espero
que não. Espero que se tire daqui as ilações adequadas.
Deixe-me contrariá-la. Com esta obsessão com o Tratado Orçamental não parece
que continuamos agarrados a critérios numéricos. Aprendeu-se de facto com a
crise?
Mostra que
não se aprendeu. As opções políticas resultam do funcionamento da democracia.
Isto tem uma leitura aparentemente muito técnica, mas por trás da técnica está
uma interpretação dominante da realidade. Ao nível do Conselho, ao nível do
Parlamento, ao nível da Comissão Europeia e em Portugal ao nível de Parlamento,
primeiro-ministro e Presidente da República, há uma convergência de leituras
que eu chamaria de direita, que pressupõe que contas públicas equilibradas
geram automaticamente crescimento económico. Por exemplo, quando comparamos o
que aconteceu na Europa com o que aconteceu nos Estados Unidos, houve uma
leitura diferente. Lá preferiu-se relançar a economia e, ao relançar a
economia, há melhores condições para fazer a correcção dos desequilíbrios das
contas públicas.
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