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quarta-feira, 2 de abril de 2014

“O Tratado Orçamental mostra que não se aprendeu com a crise”


Perfil
Mulher do Norte
Elisa Ferreira, eurodeputada, tem 58 anos e é uma mulher do Norte.
Nasceu no Porto, licenciou-se em Economia na Faculdade de Economia da Universidade do Porto, fez o mestrado e o doutoramento na Universidade de Reading, no Reino Unido. Em 1995, foi ministra do Ambiente no primeiro governo de António Guterres e depois do Planeamento.
É deputada do Parlamento Europeu pelo PS desde 2004 e este ano volta a integrar as listas socialistas.
Candidatou-se à Câmara do Porto como independente, mas perdeu para Rui Rio. É e tem sido uma das vozes mais activas no Parlamento Europeu, integra a Comissão de Assuntos Económicos e Monetários e foi relatora do documento do Parlamento Europeu sobre o mecanismo de resolução bancária.
Rosário Lira Bruno Proença
Economia Para a eurodeputada, um dos problemas da UE é preocupar-se demasiado com critérios para défice e dívida e esquecer o crescimento económico. Erros repetidos no Tratado Orçamental.


Elisa Ferreira destacou-se enquanto eurodeputado, nomeada­mente como relatora do docu­mento do Parlamento Europeu sobre o mecanismo de resolução bancária, um dos pilares da união bancária. 
O seu trabalho valeu-lhe elogios internacionais e até de Pedro Passos Coelho. 
Elisa Ferreira defende um maior apro­fundamento da união bancária para proteger os contribuintes dos eventuais problemas futuros nos bancos. 
Ainda assim, é muito critica do trabalho da troika e da visão que a maioria de direita im­pôs: o equilíbrio orçamental trará automaticamente crescimento económico. 
Sobre a saída da troika de Portugal, acredita que Europa quer uma saída limpa e não tem dúvidas que o PS ganha­rá as próximas eleições europeias.

O primeiro-ministro destacou o seu papel no acordo alcançado entre o Parlamento Europeu e o Conselho a propósito da união bancária. Estas palavras de Pedro Passos Coelho caíram-lhe bem?
Caíram bem. Foi simpático da parte dele ter tido essa iniciativa. O nosso trabalho neste caso foi para Portugal e para a Europa, portanto ultrapassa as diveigências partidárias. Estávamos a falar de uma matéria onde o Conselho tinha chegado a uma posição de unanimidade, uma unanimidade forçada porque Portugal e vários outros Estados estavam de algum modo subjugados pelo poder táctico da Alemanha e de uma série de países amigos da Alemanha. A legislação estava muito desequilibrada e era até perigosa. O Parlamento quando entrou nas ne­gociações reequilibrou as posi­ções que vinham do Conselho.

Martin Schulz também fez elogios.
Houve de facto um certo alívio com o reequilíbrio que já parecia impossível e que foi conseguido com o papel do Parlamento.

Quanto ao acordo alcançado, é mais um passo na união bancária. Os cidadãos podem ficar mais tranquilos perante eventuais problemas noutros bancos?
um conjunto de legislação, de que esta faz parte, que procura ti­rar as lições daquilo que correu mal na crise da dívida soberana, que não começou na dívida soberana, mas sim nos mercados fi­nanceiros. A lógica liberal que imperou durante muito tempo levou a que houvesse uma ausên­cia clara de regulação sobre os mercados financeiros a nível mundial. A Europa podia ter tido um papel mais forte e não teve. A partir de 2010, a atitude dos polí­ticos mudou em relação a este processo e no caso da regulação dos bancos, a gestão de uma crise bancária é uma das peças desse quadro mais alargado. Pretende-se criar um sistema em que haja regras claras de funcionamento quando um banco entra numa si­tuação de crise. Essa situação deve dar origem a uma situação de resolução, que passa por intervir no banco e reestrutura-lo profundamente de maneira a im­putar as perdas aos accionistas e a outros credores do banco e não aos contribuintes. Depois, há um fundo financiado pela própria banca em função do seu risco, uma espécie de seguro, que esta entidade que se encarrega da re­solução do banco vai utilizar para poder desmantelá-lo.

Com a nova legislação vai conse­guir separar o risco bancário do risco país? O que é importante para facilitar o financiamento à economia?
É isso que se pretende. Por isso, é muito importante a criação do fundo financiado pelos bancos, que durante oito anos vai acumu­lar o montante de 55 mil milhões de euros para que as entidades de resolução tenham uma espécie de um fundo de maneio para opera­rem. Agora, é muito importante que haja uma linha de crédito en­quanto este fundo é montado, caso haja uma situação de um banco que precise de ser inter­vencionado.

Nós temos um mercado interno, livre circulação de mercadorias e uma moeda única, mas ancorada no Tratado de Maastricht, acordada num pacto de estabilidade e crescimento com limites de 60% para a dívida e 3% para o défice. 
Esqueceu-se a parte do crescimento, que é interpretada de uma forma grosseira e isto não chega.

O Parlamento Europeu discutiu recentemente um relatório que avaliou o trabalho da troika nos vários países. Na sua opinião, como é que se pode avaliar a troika?
Tenho sido muito crítica do tipo de solução que foi encontrada. É uma solução admissível numa situação de emergência, mas que esconde a reflexão que tem de ser feita. É uma das mensagens desse inquérito sobre a troika: como é que uma união monetária pode funcionar e vingar com econo­mias tão diferentes. Nós temos um mercado interno, livre circu­lação de mercadorias e uma moe­da única, mas ancorada no Trata­do de Maastricht, acordada num pacto de estabilidade e cresci­mento com limites de 60% para a dívida e 3% para o défice. Esque­ceu-se a parte do crescimento, que é interpretada de uma forma grosseira e isto não chega. Crises num país ou na zona euro existi­rão sempre...

Vamos continuar a ter troikas?
Espero que não. Espero que se tire daqui as ilações adequadas.

Deixe-me contrariá-la. Com esta obsessão com o Tratado Orça­mental não parece que continua­mos agarrados a critérios numé­ricos. Aprendeu-se de facto com a crise?

Mostra que não se aprendeu. As opções políticas resultam do fun­cionamento da democracia. Isto tem uma leitura aparentemente muito técnica, mas por trás da técnica está uma interpretação dominante da realidade. Ao nível do Conselho, ao nível do Parlamento, ao nível da Comissão Europeia e em Portugal ao nível de Parlamento, primeiro-ministro e Presidente da República, há uma convergência de leituras que eu chamaria de direita, que pressu­põe que contas públicas equili­bradas geram automaticamente crescimento económico. Por exemplo, quando comparamos o que aconteceu na Europa com o que aconteceu nos Estados Uni­dos, houve uma leitura diferente. Lá preferiu-se relançar a econo­mia e, ao relançar a economia, há melhores condições para fazer a correcção dos desequilíbrios das contas públicas.



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