Hélder Bataglia
Administrador da Escom
CASO GES
Texto Hugo Franco e João Vieira pereira
Fotos Tiago miranda
Apanhado no meio do furacão que
tem varrido o Grupo Espírito Santo, o luso-angolano Hélder Bataglia,
administrador da Escom, empresa investigada pelos procuradores portugueses,
diz estar “superdisponível” para colaborar com as autoridades. Garante que nada
sabe do negócio gorado entre a Escom e a Sonangol. Saiu da Akoya, empresa de
gestão de fortunas suíça, na mesma semana em que os três gestores suíços foram
detidos por causa do “Monte Branco”. E diz-se "tranquilo” com o caso dos
submarinos do qual é arguido.
P - Foi a partir da venda gorada da Escom, que
o Ministério Público começou a investigar o Grupo Espírito Santo. Prestou
declarações sobre este negócio?
R - Nunca fui
contactado nem prestei declarações sobre este assunto, apesar de estar
superdisponível para as fazer.
P - O Ministério Público terá razões para ter
suspeitas sobre o negócio?
R - Não sei. Não
conheço o negócio. Nunca estive nas negociações da venda. Por duas vezes fui
informado que o negócio iria ser concretizado, mas nunca o foi.
P – Quem são afinal os angolanos que queriam
comprar a Escom. É, ou não; a Sonangol
R - Sim. Uma empresa-veículo,
a Newbrook, serviu para a aquisição da Escom por parte da Sonangol.
P – O negócio foi feito?
R
- O contrato-promessa foi assinado a 28 de dezembro de 2010. Foi feito um
pagamento inicial de 15% (mais um montante para a aquisição da Opway Angola,
detida em parte pela Escom), de 80 e tal milhões de dólares. Eu optei por
esperar pela parte final do pagamento (tinha a perceção de que o GES precisava
desses fundos para o aumento de capital que estava a preparar para o banco) e
acabei por nunca receber dinheiro dessa operação.
P - O Mas porque é que a Sonangol não comprou a Escom?
R - É uma pergunta de
800 milhões de dólares. O entusiasmo inicial deles era total.
P - No entanto, quatro anos depois de ter
pago o sinal de 80 milhões, tudo continua igual…
R - Não é normal...
P - O desinteresse dos angolanos na Escom está ligado à crise do BES Angola?
R - Tem algum
relacionamento. A partir do momento em que começaram a sentir que havia
problemas no banco em Angola as coisas começaram a não correr tão bem. Para os
angolanos e para todos nós, o GES era um grupo fundamental. E sentem uma certa
confusão com tudo o que
se passa.
P - Fica espantado com todas estas suspeitas em
redor de Ricardo Salgado?
R - Foi uma surpresa
muito grande. Não imaginava nada disto. Mas recordando o passado, quando em
2006 Salgado dizia que o grupo não tinha dinheiro nem dimensão para investir
num projeto da dimensão da Escom,
no fundo ele estava a ter uma perceção dos problemas financeiros.
P - Este caso do BES põe tudo em perigo?
R - Põe tudo em perigo, como é evidente!
P - Qual é a dívida da Escom neste momento?
R - É de 806 milhões
de dólares. Há quatro anos, na altura da venda, era de 549 milhões de dólares.
P - É caso para dizer que a Escom se está a
desmoronar?
R - A Escom não se
está a desmoronar, porque não deixamos. Este mês uma diretiva
do Banco de Portugal
junto do BESA impediu-nos de pagar salários ao pessoal. Decidi pagar do meu
bolso (a Escom tem dois mil trabalhadores) porque acredito que a empresa ainda
é viável, desde que tenha capital.
P - Foi também administrador do BES Angola.
Ainda é possível salvar o banco?
R - Sim. Os angolanos
estão a estudar esse assunto.
P - Uma garantia de 5.7 mil milhões de dólares
por causa do crédito concedido a um banco não é normal. A auditoria interna
fala em 3 mil milhões de dólares de crédito malparado. Essa quantia não o
espanta?
R - Espanta-me um pouco.
P - Para onde foi tanto dinheiro?
R - Não sei.
P – Quando estava no BES Angola, apercebeu-se de
que os processos de concessão de crédito não eram os melhores?
R
- Infelizmente, eu estava pouco tempo no banco. Não podia apoiar
convenientemente o Álvaro Sobrinho [presidente do BES Angola até 2013] e por
isso me penitencio. Muitas vezes ele estava sozinho no Banco.
P –
Acha então errada a opinião de Rui
Guerra [presidente da Comissão Executiva do BES Angola] de que Álvaro Sobrinho terá
sido o beneficiário de muitos empréstimos concedidos pela BESA?
R - Têm de perguntar
isso ao Rui Guerra.
P - Álvaro Sobrinho é vitima neste processo?
R - A história não
está toda contada.
P - Recebeu 52,5 milhões de dólares
de uma transferência do BESA através de offshores?
R - Na noite em que li essa notícia no Expresso fui ter com o
Rui Guerra para lhe explicar essa transferência. Disse-lhe que tinha vendido a
minha participação no BESA dois anos
antes por 60 milhões de dólares. Ele disse que não sabia.
P – Vendeu essa participação a quem?
R - Ao Álvaro
Sobrinho. Na altura, até tinha outros compradores para a participação. Mas
como ele ia continuar no BESA e tinha estado comigo dez anos no banco, achei
natural vender-lha.
P - E o que lhe respondeu a Rui Guerra?
R - Disse que não
sabia. Mas a operação tinha sido feito na área jurídica do banco. Esse assunto
está esclarecido.
P - Conhece o empresário português José Guilherme?
R - Conheço. É uma pessoa extraordinária.
Foi-me apresentado pelo
Grupo Espírito Santo com o objetivo de o apoiar já que ele nem
conhecia Angola. Fizemos três projetos imobiliários com ele. É uma
pessoa de palavra.
P - Foi Ricardo Salgado que o aconselhou?
P - É normal pagarem-se prendas de 14 milhões de euros?
R - Não é uma coisa que se veja todos
os dias.
P - Aceitaria uma prenda assim?
R O José Guilherme é uma pessoa de
grande generosidade. Mas acharia estranho receber uma prenda de 14 milhões de
euros.
P - Era acionista e sócio de Álvaro Sobrinho na
Akoya, empresa suíça de gestão de fortunas, investigada no caso “Monte Branco”…
R - Na altura do negócio da Escom e da venda da minha
participação no BESA, o gestor suíço da UBS, Michel Canais, sabendo que estas
operações iriam gerar 260 milhões de dólares, disse-me que ia fazer uma
empresa de gestão de fortunas, com dois sócios que eu não conhecia. Aceitei
entrar. Na altura, achei que não devia ser sócio sozinho e lembrei-me de Álvaro Sobrinho.
P - Qual foi o seu investimento na Akoya?
R - 400 mil francos suíços cada um (330 mil
euros). Nunca fiz parte da gestão. Na semana em que os três gestores foram
detidos, em abril de 2012, saiu um parecer anual do regulador suíço a dar nota
superpositiva à Akoya. Ao que parece, o único problema era a gestão que faziam dos recursos
de alguns clientes portugueses;
P – Ficou surpreendido
com a detenção de Michel Canals?
R – Tão surpreendido que saí da Akoya nessa mesma semana e tirei os
fundos que tinha na empresa
P – Apresentou Canals a
pessoas da GES?
R – Nunca. No início, Ricardo Salgado nem sabia que eu era sócio da
Akoya.
P – O negócio de venda da
Escom com a Sonangol passou pela Akoya?
R – Não sei. O pagamento foi feito pela Newbrook. Não sei se tinha conta
no Crédit Suisse.
P – O que se passou com o
negócio dos submarinos, do qual é arguido?
R – Trabalhámos, e muito, nesse negócio desde 1996. Aconselhámos os
alemães do German Submarine Consortium (GSC) sobre quais as contrapartidas que
deviam propor ao Governo Português.
P – Os investigadores consideram
“desproporcional” o montante de 30 milhões pagos pela GSC à Escom pelo serviço
de consultadoria…
R – Não acho. Os contratos estão feitos percentualmente sobre o volume
total dos montantes. Aos procuradores respondi ao que me foi perguntado e
esclareci tudo. Fiquei tranquilo. A única coisa que me preocupa é a imagem que
as pessoas possam ter, pensado que nos apropriámos de dinheiro que não era
nosso.
P – Houve depois
pagamento à família Espírito Santo deste serviço de consultadoria?
R - 0 caso está em segredo de justiça. Quando deixar de o ser, esclareceremos
tudo. Em 11 anos, não foi deduzida qualquer acusação neste caso.
jvpereira@expresso.impresa.pt
PERFIL
Nome Helder José Bataglia dos Santos
Naturalidade Nasceu em Lisboa em 1947, filho
de pais de Vieira de Leiria e do Alentejo
Juventude Cresceu no sul de Angola e passou
a juventude em Benguela. Em Lisboa, frequentou o curso de engenharia no ISEL
Família Casou-se duas vezes, tem duas
filhas e duas netas que vivem em Lisboa
Início Tornou-se
empresário de secagem
de produtos alimentares em Benguela ainda antes da independência
Negócios Associou-se à família Espírito
Santo em 1991, quando esta recuperava o poder económico depois das nacionalizações.
A Escom tornou-se em pouco tempo um dos
mais poderosos grupos económicos em Angola. Começou pela distribuição alimentar
mas tornou-se multo lucrativa com o
negócio da extração de diamantes e do
imobiliário Durante dez anos, Bataglia foi também administrador do BES Angola
China Bataglia fez reaproximar a China
de Angola através dos negócios das infraestruturas. O China International Fund
Limited investiu no país quase 3 mil milhões de dólares.
Chavez No programa diário de rádio,
Hugo Chávez fez uma menção especial ao luso-angolano “Helder? Como te síentes
aqui Hélder?”, disse o então o Presidente venezuelano em direto.
Bataglia chegou a acompanhar Chávez durante uma deslocação de dez
horas fora de Caracas
Congo Foi condecorado pelo Presidente
Nguesso, em honra dos serviços prestados na República do Congo
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