O Cartoon de António Dançando com o lobo mau
Pedro santos guerreiro
Expresso, 9 de agosto de 2014
De A de Amilcar a Z de Zeinal num e-email de há um
mês é verdade, então muita gente na PT e na OI sabia do investimento no GES.
Data do e-mail levanta dúvidas sobre a intenção
“Caro Sérgio.” “Prezado Ricardo”. É com bons modos que os
então presidentes da Andrade Gutierrez (acionista
da Oi) e do BES (acionista da PT) se cumprimentam.
Mas a tensão não podia ser maior; no início de julho, estavam já em guerra por
causa do prejuízo de quase 900 milhões em papel comercial do
Grupo Espírito Santo. Numa troca de e-mails a cuja cópia o Expresso teve
acesso, Ricardo Salgado fala de um
acordo para a compra desse papel comercial, que Sérgio Andrade nega existir.
Mais: Salgado envolve dezenas de pessoas, dizendo que tinham conhecimento.
Incluindo Zeinal Bava, que o negou. O e-mail é incriminatório. Mas a data levanta suspeitas sobre se terá
sido “plantado” para esse efeito.
Email #1:
1 de julho, 16:55
“Caro Ricardo. Surgiu
uma proposta, por parte dos advisors da Oi para o problema da dívida que parece ser boa. Amilcar está a par.
Abraço, Sérgio” É assim, num e-mail curto, que começa a
correspondência. À data, o escândalo já tinha rebentado, os administradores
brasileiros já se tinham demitido da PT e decorriam negociações que levariam a
PT a reduzir a participação na fusão com a Oi.
O “problema da dívida”
era esse: um prejuízo que estava, ademais, a arrastar as cotações e a abrir
portas a uma chuva de processos judiciais.
Email
#2: 8 de julho, 7:46
“Caro Sérgio, estou
surpreendido com a situação porque certamente que o Sérgio se lembra de que o
GES teria uma contrapartida equivalente ao benefício das holdings privadas brasileiras no aumentode capital”. Este é
oarranque da resposta de Salgado e contém uma revelação bombástica: se o
aumento de capital tinha permitido “limpar” as dívidas dos acionistas
brasileiros junto do banco estatal brasileiro BNDES, haveria acordo que previa
que a PT/Oi investisse o mesmo valor no GES. Ou seja, em papel comercial
(Sérgio Andrade nega esse acordo, já lá vamos).
“Tive o cuidado de falar
com o presidente-executívo da Oi no inicio das aplicações que têm vencimento a 15
e 17 de julho, uma vez que deveriam ser sucessivamente renovadas por prazos
de três meses até um ano a contar do seu inicio em fevereiro”. Se este segundo
parágrafo é verdade, Bava soube do investimento, Ele e muitos outros: “Esse
assunto foi também abordado pelo dr. Amilcar Moraes Pires na reunião de Steering Comitee de 14 de
abril, em Lisboa”. O Steering Comitee é um comité de
acompanhamento das negociações entre a PT e a Oi, na fusão. Segundo informação
na CMVM, o comité é composto por Zeinal, Morais Pires, Henrique Granadeiro, José Mauro da Cunha, Nuno Vasconcelos, Otávio de Azevedo e Pedro
Jereissati. Toda esta gente sabia?
Email
#3: 8 de julho, 19:31
“Prezado Ricardo, tenho a
certeza de que os assessores da Oi estão procurando uma solução que minimize ao
máximo os danos da operação, decidida, conformne facto relevante da PT, por seu
comité executivo”. O cuidado jurídico da resposta é evidente. Sérgio Andrade
coloca o ónus na comissão executiva da PT. Depois, desmente o acordo: “Creio
que seu e-mail faz referência a um
mal entendido, pois os aportes de capital que foram realizados na cadeia societária
da Telemar (Oi) foram feitos, exclusivamente com base em interesses legítimos
das partes”.
Houve acordo?
Esta é a primeira questão
que o e-mail
levanta: tinham a PT e a Oi um acordo para o investimento em papel
comercial da Rioforte, que deveria ser renovado até fevereiro de 2015? Ou será
este e-mail de
Ricardo Salgado uma cilada jurídica, para que ficasse registado um acordo supostamente
feito no passado? Contactada pelo
Expresso, fonte autorizada de Ricardo Salgado confirma e garante a existência
de negociações entre acionistas brasileiros e portugueses para o acordo para o papel
comercial da Rioforte durante um ano. A mesma fonte não quis comentar os e-mails.
Também contactado, Sérgio
Andrade respondeu pela assessoria de imprensa: A Andrade Gutierrez “desconhece as afirmações
que feriam sido feitas no e-mail do dr. Ricardo Salgado e estariam sendo interpretadas pelo
Jornal.” Mas responde depois a uma série de perguntas: “Cabe ressaltar que os sócios
brasileiros não tinham qualquer conhecimento dessa operação, realizada entre a
PTe o GES”.
Também o acordo que Salgado
garante existir é negado, aliás nos termos do e-mails os
aportes de capital na Telemar “foram realizados com base em avaliações
consistentes, e com o objetivo de simplificar a estrutura societária”, de modo a permitir a
“migração para o Novo Mercado e a integração das bases acionárias das duas
companhias.” Mais: “Os assessores financeiros e legais da Oi trabalharam
intensamente procurando encontrar soluções que pudessem, dentro dos limites
impostos pela lei, minimizar ao máximo os danos da operação.”
Quem sabia?
Quem afinal sabia do
investimento na Rioforte: Segundo o e-mail de
Salgado, toda a gente está implicada, em Portugal e no Brasil, o que desmentiria
a versão dos brasileiros e também de Zeinal. Até aqui, os administradores
Henrique Granadeiro e Luís Pacheco de Melo assumiram a responsabilidade, quando assinaram o comunicado
ao mercado confirmando o investimento. Esta quinta-feira, Granadeiro demitiu-se, afirmando: “Convivo bem com os meus atos, mas não com os
encargos e responsabilidades de outros”, no que foi assumido como um passa-culpas.
O tema é importante porque
está a ter consequências diretas, levando a demissões. Mas também porque pode ter consequências legais. O e-mail de Ricardo Salgado é mais uma peça neste puzzle.
Escrito em plena guerra com os brasileiros, invoca um acordo que outros negam e
implica gente que desmente. Quem fez? Quem soube? Quem mente?
Pires de Lima espera “consequências”
"Vamos
ver como funciona a justiça e com o se comportam os acionistas. Mas se estes
acontecimentos passarem impunes, será mais difícil atrair investimento para
Portugal. Isto deixa feridas profundas” — as palavras de António Pires
de Lima não deixam dúvidas sobre o impacto que na sua opinião, os casos BES e
PT estão a ter na reputação do país. A preocupação do governante.
"Inconformado
com o que se passou nestes dois casos”, é sinalizar aos investidores que a
árvore não deve ser confundida com a floresta, “É preciso fazer a destrinça" entre
estes casos e a economia nacional. Os dados conhecidos esta semana, sobre a
evolução do emprego e das exportações, são positivos, mas não é certo que façam
esquecer a queda da Bolsa portuguesa nesta semana. Se, em Portugal, o caso da
PT estava a passar por baixo do radar, pelo meio da tempestade do BES, o
ministro da Economia tratou de voltar a puxar a situação da operadora para o
topo da agenda. Pires de Lima criticou a “desfaçatez verificada na PT”, no
investimento de €900 milhões na Rioforte, ao mesmo tempo que considerou
“inexplicáveis” os acontecimentos nesta empresa e no BES. Factos que ligou ao trambolhão da
Bolsa na terça e quarta-feira, dia em que interrompeu as férias e falou a
vários órgãos de comunicação social. F.S.C.
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