As
acções do Banco de Portugal, enquanto regulador, podem ser impugnadas junto dos
tribunais administrativos
FILOMENA LANÇA
Impugnar a decisão do Banco de Portugal poderá ser uma
forma de clientes e investidores do BES se defenderem em tribunal. Advogados
dizem que ainda é cedo e que as acções a título individual podem sair demasiado
caras.
De que forma podem os
clientes do BES, pequenos accionistas, grandes e pequenos investidores que se considerem lesados, fazer
valer os seus direitos em tribunal? Os advogados recebem cada vez mais clientes
a colocar-lhes essa questão, mas poucos arriscam, para já, respostas definitivas.
Uma hipótese que ganha algum terreno é a impugnação da resolução do BES pelo
Banco de Portugal (BdP), uma acção que terá de ser interposta num prazo de 90
dias.
“Fará algum sentido e
juridicamente é perfeitamente possível”, afirma Paulo Veiga Moura, advogado
especialista em direito administrativo. Sendo a liquidação um acto do regulador,
pode ser sujeito a apreciação judicial, algo que não seria possível se tivesse
sido uma decisão política, do Governo, já que os actos políticos não podem ser
impugnados.
Também Miguel Reis,
da sociedade de advogados que recentemente divulgou publicamente a acta do
Conselho de Administração do BdP, afirma que esse poderá ser um dos caminhos,
embora sublinhe que “falta ainda muita informação, dados que não são revelados
e que o próprio regulador não dá”.
A impugnação está prevista no
Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que remete
para o contencioso administrativo no que toca a prazos. No entanto, o mesmo
artigo que admite a impugnação das decisões do BdP que adoptem medidas de resolução,
prevê igualmente várias excepções. Estão em causa os chamados bancos de
transição - a natureza do Novo Banco - e, caso o tribunal declare a nulidade de algum
dos seus actos, o BdP pode “invocar causa legítima de inexecução”, ou seja, o
grave prejuízo para o interesse público na execução da sentença. “E como é
certo que o fará, os lesados terão então direito a uma indemnização”,
esclarece Paulo Veiga e Moura. A indemnização teria de ser paga pelo BdP e o
valor fixado por acordo entre as partes.
Há responsabilidade por erro?
Miguel Reis, também
ainda a estudar o assunto, lembra que este tipo de acções “ficam muito caras,
se quisermos chegar ao Supremo em sede de recurso” e não aconselha processos
a título individual, mas antes em colectivo. Além disso, é preciso não esquecer
que toda a actuação do BdP está fundamentada em legislação comunitária,
entretanto, já transposta para o direito nacional.
Entre os principais
escritórios de advogados de Lisboa, poucos arriscam falar sobre o assunto e há
quem apenas o faça em “off”. Ou porque têm clientes de alguma forma envolvidos,
ou porque, dizem, ainda é cedo e “continua a faltar muita informação”.
Há quem não descarte,
por exemplo, uma acção de responsabilidade civil extracontratual do Estado
com base na chamada responsabilidade por erro. Porquê? Porque foram dadas indicações
de que o BES estaria sólido e solvente que acabaram por se verificar não ser
verdadeiras, mas que levaram os investidores a formar uma vontade. Nesse caso,
seria preciso provar em tribunal a “essencialidade dos motivos para fazer o
negócio”, explica um advogado especialista em processo civil. Isso
significaria, na prática, provar que “sem aquelas declarações dos responsáveis,
não teriam, por exemplo, investido no aumento de capital”. O problema seria
provar. Seria preciso convencer o tribunal de que “o cidadão médio, colocado
naquela situação, teria agido da mesma maneira”. Uma tarefa “complexa, de
grande sensibilidade e com resultados incertos”, remata o jurista.
«A impugnação da acção do Banco de Portugal de resolução
do Bes fará algum sentido e juridicamente é perfeitamente possível.
Caso o Tribunal declare a nulidade de algum dos seus
actos, o Bdp pode invocar o grave prejuízo para o interesse público na execução
da sentença.
PAULO VEIGA E MOURA
Advogado e
especialista em Direito Administrativo
Estas acções ficam muito caras se quisermos chegar ao
Supremo em sede de recurso.
Não aconselhamos processos individuais, mas sim
colectivos. »
MIGUEL REIS
Advogado
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