Pedro Santos Guerreiro - 19:59 Segunda-feira, 1 de Dezembro de 2014
Declarações de Sikander Sattar publicadas no Expresso no início de setembro foram o passo final para o afastamento de Pedro Duarte Neves das áreas mais sensíveis da supervisão do Banco de Portugal. Em causa uma reunião de 16 de julho que era desconhecida. O Expresso recupera a entrevista, numa altura em que Sikander Sattar se prepara para ser ouvido na comissão parlamentar de inquérito ao BES, onde vai esta terça-feira.
[republicação da entrevista. Para lê-la na íntegra carregue AQUI ]
O Expresso revelou a 5 de setembro a existência de uma reunião entre a CMVM e o Banco de Portugal a 16 de julho.
As datas das reuniões são relevantes por causa da prestação de informação ao país e ao mercado.
Carlos Costa, recorde-se, esteve no Parlamento por duas vezes, sendo que na primeira vez, a 18 de julho (dois dias depois dessa reunião), afirmou que o BES estava sólido e tinha almofadas de capital suficientes para acomodar problemas.
Uma semana depois, a 25, foi a vez de Carlos Tavares ir ao Parlamento.
O presidente da CMVM foi mais cauteloso e remeteu para os resultados semestrais.
Esse resultados - prejuízos de 3,6 mil milhões de euros - acabariam por ser publicados no dia 30, precipitando o "crash" das ações em Bolsa nos dias seguintes e, no fim de semana, a intervenção do Estado.
A 6 de setembro, o Expresso noticiou que o vice-governador se preparava para perder poderes no Banco de Portugal.
No mesmo dia, em reação à entrevista no Expresso, Pedro Duarte Neves emitiu um comunicado detalhando as condições da reunião de 16 de julho.
O Expresso republica agora a parte da entrevista de Sikander Sattar que esteve na base da polémica.
Têm sido noticiadas datas de várias comunicações entre a KPMG e os reguladores, no âmbito da processo BES e GES.
Há uma reunião, no entanto, que ainda é desconhecida: o Expresso sabe que a KPMG se reuniu no Banco de Portugal a 16 de julho.
Confirma?
É verdade que no dia 16 há uma reunião no Banco de Portugal, onde esteve presente o Prof. Pedro Duarte Neves e o diretor de supervisão.
Mas Carlos Costa diz que só soube da dimensão dos prejuízos do BES no dia 25 de julho.
Se o senhor governador do Banco de Portugal diz que só soube no dia 25 do valor da quantificação dos ajustamentos identificados pela KPMG, eu acredito.
Eu não tive nenhuma reunião com o senhor governador.
Se ele disse que só soube no dia 25, é porque só soube no dia 25.
O que eu posso dizer é que, como também vem hoje [quarta] num órgão de comunicação social dito por uma fonte oficial do BdP, o BdP recebeu um email no dia 22 da KPMG.
A KPMG não envia emails que não tenham substância e impacto que seja materialmente relevante ou significativo.
O que diz esse email?
Leia. [Mostra uma cópia do email]
O email é enviado a Luís Costa Ferreira, diretor de supervisão do BdP.
Explica que foi detetado o esquema com as obrigações e que é possível que desta situação venham a ser identificados impactos significativos nas contas do BES, bem como a eventual existência de transações que não tenham sido efetuadas no melhor interesse do banco.
Ou seja, a KPMG informou o Banco de Portugal que haveria impactos significativos nas contas do BES.
Isto foi no dia 22.
E no entanto o governador só soube no dia 25.
Como?
Não faço comentários porque não tenho conhecimentos da forma como a informação é comunicada dentro do Banco de Portugal.
Se a KPMG informou o diretor de supervisão no dia 22 e o governador só soube a 25, conclui que o diretor de supervisão não informou o governador deste email?
É uma conclusão plausível?
[Anui com a cabeça]
E a tal reunião de dia 16?
Essa é anterior a o governador ter ido à Assembleia da República afirmar que as almofadas de capital eram suficientes.
O que se passou nessa reunião?
No dia 16 houve uma reunião, na sequência de contactos que tínhamos tido com a CMVM. Na reunião de 16 de julho demos a indicação ao BdP de que tínhamos identificado a situação da recompra das obrigações com perdas para o BES e que estávamos a investigar essa matéria e que logo que tivéssemos as conclusões iríamos reportar, como reportámos no dia 22.
Mas no dia 16 alertámos para a existência de um problema. [Lê um documento interno]
A KPMG informou que havia tomado conhecimento da recompra de obrigações emitidas a partir de 11 de julho com perdas significativas para o BES e que poderiam indiciar problemas.
Mas há uma coisa mais importante do que isso.
Nestes contactos que tivemos, a CMVM informou-nos de que ao mesmo tempo que a KPMG estava a fazer essas investigações, a CMVM estava em contacto com o Banco de Portugal sobre o mesmo tema.
Volto a repetir: o senhor governador diz que tomou conhecimento no dia 25 e eu só posso acreditar na sua palavra; a KPMG enviou o email no dia 22 como o próprio BdP confirma; há uma reunião de alerta no dia 16 da KPMG; e há contactos entre a CMVM e o BdP antes do dia 16...
Mas tudo isso são datas, o que importa é termos descoberto o problema.
Desde novembro de 2013 até 31 de julho de 2014, houve um trabalho de estreita colaboração entre a KPMG e as duas entidades reguladoras, o Banco de Portugal e a CMVM.
Foi esse espírito de diálogo e de contacto permanente que deu estes resultados.
Como correu o trabalho com o Banco de Portugal?
Relativamente ao GES e à exposição do papel comercial do GES, o contacto permanente da KPMG foi praticamente com o BdP, entre novembro e o momento do prospeto do aumento de capital.
Só na altura em que o prospeto foi para aprovação da CMVM é que o Banco de Portugal solicitou à KPMG que fosse enviado uma cópia do relatório da ES International à CMVM. Só nessa altura é que a CMVM conheceu o detalhe dos ajustamentos que tinham sido propostos pela KPMG em relação à ESI e as consequências disso em relação ao Grupo Banco Espírito Santo e ao grupo ESFG.
Até aí, o contacto tinha sido com quem tinha solicitado o trabalho, que era o Banco de Portugal.
Nesses nove meses houve pelo menos 40 reuniões entre a KPMG e o Banco de Portugal, excluindo contactos telefónicos.
Foi um grande espírito de colaboração.
É importante salientar, e não tenho visto isso dito nem dito: o mais importante é descobrir o problema e ajustá-lo, como foi feito antes da apresentação das contas.
Tem-se falado muito sobre as datas, mas na minha opinião não tem sido dado o relevo necessário ao facto de que, numa situação de operações complexas, que passaram por várias jurisdições - Luxemburgo, Portugal, Suíça, Panamá -, mesmo assim foram as operações foram identificadas e ajustadas.
O facto inequívoco e indiscutível é que tudo foi descoberto e foi ajustado.
As contas apresentavam no dia 30 de julho de uma forma apropriada e verdadeira a situação financeira do BES.
E portanto nós estamos perplexos, porque se discutem muito as datas em que a situação foi descoberta e não o facto de essas contas apresentarem a realidade da situação financeira do banco naquele momento.
O que é mais importante?
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