17 novembro de 2014
OPINIÃO
NICOLAU SANTOS
nsantos@expresso.impresa.pt
O primeiro dia da Comissão Paralamentar de Inquérito ao caso BES marca o começo do cansaço que nos vai invadir à medida que ele avançar.
Ninguém tem paciência para ouvir 121 pessoas durante quatro meses ou mais.
Soubessem os deputados as técnicas das telonevase eliminariam a generalidade dos actores secundários. O que conta são as personagens fortes: os bons, os maus e os vilões. O resto só serve para encher episódios. Mas se na telenovela funciona, na vida real corre o risco de contribuir para desinteressar os cidadãos.
O alinhamento escolhido pelos parlamentares é um erro. No fundo, começa por se julgar os polícias, Banco de Portugal e Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, para tentar «entalar» o governador Carlos Costa, quer por falta de actuação em tempo oportuno, mas também por não ter passado informação relevante à CMVM sobre o caso, o que terá impedido uma actuação mais atempada por parte desta. Seguem-se depois os representantes da troika, que serão obviamente acusados de terem andado por cá sem descobrirem o que se passava no BES e se terem postoa milhas imediatamente antes da implosão do banco. E quando estivermos todos convencidos que o Banco de Portugal, a CMVM, a Comissão Europeia, o BCE, o FMI, o Governo e Vítor Bento foram todos responsáveis, por acção ou omissão, pela forma como foi resolvido o cado BES, então teremos finalmente direito a que quem levou o banco e o grupo a este estado de coisas diga finalmente de sua justiça. Ou seja, primeiro inculca-se fortemente na opinião pública que as autoridades de supervisão, os organismos internacionais e o Executivo constituiem um grupo de polícias completamente incompetentes e que actuaram com intenções escondidas. E depois chamam-se então os criminosos, que nessa altura já estarão razoavelmente desculpados não só pelo tempo que entretanto passou, como pelo manifesto desleixo com que actuaram os polícias.
O QUE CONTA SÃO AS PERSONAGENS FORTES: OS BONS, OS MAUS E OS VILÕES. O RESTO SÓ SERVE PARA ENCHER EPISÓDIOS. MAS SE NA TELENOVELA FUNCIONA, NA VIDA REAL CORRE O RISCO DE CONTRIBUIR PARA DESINTERESSAR OS CIDADÃOS.
O espantoso é que foi exactamente isto que aconteceu na comissão parlamentar de inquérito ao caso BPN. A pessoa cuja imagem mais saiu demolida foi a do ex-governador Vitor Constâncio, que foi massacrado (sobretudo pelo deputado centrista Nuno Melo) em duas longuíssimas sessões na Assembleia da República. Ao contrário, o presidente do banco e mentor do escandaloso esquema fraudulento pelo qual os portugueses estã a pagar mais de 4 mil milhões de euros, Oliveira e Costa, foi alvo de uma sessão branda, tão branda que até lhe permitiu dizer piadas e quase que sentimos alguma pena por só ele estar em prisão domiciliária e não haver mais ninguém condenado, nem sabermos quando tal acontecerá.
No caso do BES camos pelo mesmo caminho. A brutal falência do maior banco privado português, com fortes indícios de frande, desvio de dinheiros, não cumprimento de indicações do Banco de Portugal, vai decorrer nos tribunais durante anos e anos, sem que ninguém seja julgado, condenado e preso.
Entretanto, Ricardo Salgado admite que tem 26,5 milhões no estrangeiro, em dinheiro vivo e património, o que pode ser perfeitamente legal ou não. Mas provavelmente também isso nunca saberemos.
A oposição quer fazer desta Comissão o que a então oposição fez a Vitor Constâncio no caso BES: massacrar Carlos Costa que, nomeado para o cargo de governador por José Sócrates, passou a ser um dos iedólogos e forte apoiante do Governo de Passos Coelho em matéria de medidas austeritárias. O Governo faz o congtrário: obriga a ir à comissão pessoas que nada vão acrescentar, como Fernando Teixeira dos Santos ou Vitor Constâncio. Mas é a resposta à estratégia da oposição. Ninguém quer sair responsabilizado politicamente deste inquérito e todos querem atirar a culpa para cima dos outros. E enquanto os deputados se forem entretendo durante meses e meses neste jogo de luz sombras, os verdadeiros responsáveis assistem calmamente e preparam meticulosamente a sua defesa. No final, os contribuintes pagarão a factura, tão certo como dois e dois serem quatro.
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