10:39 Quarta-feira, 19 de novembro de 2014
Filipe Santos Costa
"Não consegue contactar o Paulo Portas, liguei muitas vezes e enviei sms". Na noite de 2 para 3 de agosto, a ministra das Finanças fez direta para ter pronta uma lei antes da resolução do BES. Às seis da manhã, quando escreveu um "email" que o Expresso Diário revela, ainda não tinha conseguido falar com o vice-primeiro-ministro.
Documento: email
Data: 3 de agosto de 2014, 6:15
De: Luís Albuquerque
Para: Luís Marques Guedes
Na madrugada de sábado para domingo, 3 de agosto, a poucas horas da resolução do BES, Maria Luís Albuquerque ainda estava a tratar de uma alteração legislativa que tinha de estar assinada pelo Presidente da República antes do anúncio da divisão do banco em BES bom e BES mau. Mas antes de enviar o documento para Belém, a ministra das Finanças tinha outro problema: precisava do consentimento de todos os ministros, em especial do primeiro. E o primeiro, nessa altura, era Paulo Portas, pois Passos Coelho estava de férias na Manta Rota. E Portas, nessa madrugada de domingo, não respondeu às chamadas da sua colega de Governo. "Não consegui contactar o Paulo Portas, liguei muitas vezes e enviei sms, mas sem sucesso", escreve a ministra num e-mail a que o Expresso Diário teve acesso. Destinatário do correio eletrónico: Luís Marques Guedes, ministro da Presidência do Conselho de Ministros. Hora: 6h15 da manhã de 3 de agosto.
"Bom dia Luís" - assim começa a comunicação electrónica enviada pela ministra das Finanças ao seu colega da PCM, e que consta da documentação enviada pelo Ministério à comissão parlamentar de inquérito (CPI) ao caso BES. "Assunto: FW: Resolução - Alteração legislativa". "Importância: Alta".
"Como combinado, ainda que um pouco mais tarde do que tinha pensado, segue proposta de alteração legislativa", começa por escrever Maria Luís. Em causa estava uma mudança no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras - a mesma lei que já tinha sido alterada, três dias antes, em Conselho de Ministros. As mexidas da quinta-feira anterior abriam caminho à solução de resolução do BES, e por essa razão foram mantidas em segredo, alegadamente para não dar sinal ao mercado sobre o que estava a ser preparado. Essas alterações de 31 de julho, tal como as que seriam aprovadas no domingo, 3 de agosto, tinham sido propostas pelo governador do Banco de Portugal, com expresso pedido de urgência.
Se já havia urgência na quinta, ela era ainda maior no domingo, dia em que a solução do BES tinha de ser anunciada. Apesar disso, Maria Luís não conseguia falar com o chefe do Governo em funções. "Não consegui contactar o Paulo Portas, liguei muitas vezes e enviei sms, mas sem sucesso", conta no e-mail a Marques Guedes. "Perto das 9h recomeçarei a tentar, mas não sei a que horas poderá estar assinado o diploma. Quanto às diligências junto dos restantes ministros fá-las-ei a partir das 10h."
As "diligências junto dos restantes ministros" tinham a ver com a necessidade de todos darem o seu aval, pois o decreto-lei tinha obrigatoriamente de ser aprovado pelo Conselho de Ministros. Assim foi, apesar dos ministros nunca se terem reunido - segundo foi explicado depois, tratou-se de um "Conselho de Ministros eletrónico". Maria Luís lá levou a água ao seu moinho e a lei foi aprovada antes da comunicação do governador do Banco de Portugal e publicada no dia seguinte em Diário da República.
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